11.10.06

Ainda sobre o World Press Photo

Acreditar na matéria sem escamotear a fúria que a habita é, afinal, o programa íntimo de muitas formas contemporâneas de arte. Ou ainda: depois da "evidência" fotográfica herdada do século XIX, trata-se agora de não temer a angústia de saber que o real não é transparente nem se oferece à suposta candura dos olhares — tudo é conflito. E uma imagem, cada imagem, é o mapa de uma guerra aberta entre linguagens. Impossível voltar a ser criança.
Por isso o mundo nos exige cada vez mais que não o olhemos como se estivéssemos a transcrevê-lo. Não há transcrição possível. Não acreditemos na beatice iconográfica das televisões que nos querem fazer olhar cada imagem como se fosse o oráculo incontestável de uma verdade (que as próprias televisões julgam possuir). Subitamente, compreendemos que para olhar, para realmente ver, é preciso ter amor nos olhos. E isso é sempre o mais difícil.


João Lopes in Sound+Vision


Irrita-me um pouco o WPP, e irrita-me por isto mesmo que acima transcrevo. O WPP é um tipo de cerimónia dos óscars da fotografia, muito hype, muitos visitantes, todo ser que é ser e se julga algo tem que ir ver o WPP, e deambulam pelas salas de exposição milhares de pessoas como que num espectáculo de variedades soltando suspiros de admiração e de horror perante a evidência fotográfica. Irrita-me toda essa gente que me parece não entender que não há transcrição possível do real, e nenhuma imagem é o óraculo incontestável de uma verdade.
É preciso ter amor nos olhos, para se fotografar como fotografam os homems que nos trazem essas imagens e é tambem preciso ter amor nos olhos para conseguir olhar para elas e ver, realmente ver.

4 Comments:

Blogger João Filipe Rodrigues said...

É por isso mesmo que eu gosto de lá ir. Para que aquelas fotos, cartas de amor escritas com luz, não definhem sob o olhar de quem vê o objecto da fotografia sem ver a estétita e a técnica, tão ou mais importantes que o objecto.
Tem de haver o amor de alguns olhares para equilibrar os pratos da balança.

PS: com isto tudo não percebi se sempre nos acompanhas ou não :P

22:58  
Blogger followanothersign said...

Ya, fazemos uma tour pelo CCB e pelo museu do chiado. Não? Manda um toque a combinar.

20:26  
Anonymous Anónimo said...

Fotojornalismo não é, de facto, Fotografia.

15:22  
Blogger followanothersign said...

Passou-se. Como não?
Photo-Secession movement, Alfred Stieglitz, Camera Work, f64, Ansel Adams, Edward Weston, Henri Cartier Bresson, Andre kertez, Elliot Erwin, Straigth Photography, e a afirmação da fotografia por si só.
Documentalismo, sim está bem, mas com amor nos olhos.

23:07  

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